Da esquerda pra direita: Amanda, Nathália, Alice, Letícia e Katarina |
Ontem
vimos um triste episódio na TV, o repórter Felipe Andreoli, recém-contratado da
Rede Globo para trabalhar no “Encontro com Fátima”, cometeu uma enorme gafe ao
falar dos cabelos cacheados/crespos, mas (ainda bem) que Wanessa da Mata
retrucou e defendeu a quebra dos padrões
de beleza ditados pela mídia convencional. Surpreendentemente, eu decidi
entrevistar as meninas do “Faça amor, não faça chapinha” no domingo, um dia
antes. Elas defendem a não existência do “cabelo ruim” ou “cabelo bom”. Segue
abaixo a entrevista com Letícia Carvalho, integrante e fundadora do FANFC.
Espero que você goste de ler, porque a entrevista está um pouquinho grande
(kkkkk).
LdeLiberdade (LdeL): Bem, vamos começar, serei direto, como surgiu o “Faça amor, não faça chapinha (FANFC)”?
Esboço de Letícia |
Letícia
Carvalho (LC): Inspirada pela página “Faça amor, não
faça a barba” ter causado certa revolução estética em relação ao que era dito
como "aparência desleixada" e afins ao valorizar a barba, criei o
esboço do que seria uma versão da página só que com foco no cabelo, pois eu
desejava que houvesse também esse tipo de "revolução estética" em
relação à visão negativa que se tinha do cabelo dito como "ruim" por
estar fora dos padrões sociais, que ditam, entre outras coisas, que o cabelo
liso é o correto. Postei então no meu Facebook pessoal esse esboço com a
legenda “Faça amor, não faça chapinha”. A postagem teve uma grande repercussão
e então criei a página.
LdeL: O FANFC é um movimento relativamente novo. Vocês pensam em continuar com a página, ou o FANFC já tem dia pra acabar?
LC: Nós não pretendemos acabar com o movimento. Pretendemos, sim, expandi-lo
cada vez mais. A luta do FANFC é diária e contínua e temos muito que lutar.
Lutamos por representatividade, visibilidade, aceitação e respeito, que são
coisas que precisam ser afirmadas e reafirmadas todos os dias, é uma luta que
não pode de deixar de existir. Seja como uma página no Facebook ou não,
pretendemos continuar com o movimento sem prazo pra acabar.
LdeL: A página do FANFC não é curtida apenas por quem tem cabelo cacheado, o que vocês pensam disso? Todos na página procuram se identificar independente do que a mídia disser?
Foto: Divulgação/Internet |
LC: Na verdade o foco da página não é especificamente sobre cabelo cacheado.
O “Faça amor, não faça chapinha” defende a liberdade e o respeito, tendo como
foco de sua luta, quebrar os padrões estéticos de beleza em relação ao cabelo,
tentando sempre desmistificar a ideia que se tem do que é "cabelo
ruim" e "cabelo bom", buscando a valorização da beleza plural e
individual. Procuramos dar visibilidade à beleza que está fora dos padrões
sociais, que geralmente não tem espaço nas grandes mídias. Isso tudo enquadra
muita coisa e atinge muitas pessoas. A questão é que, se você não está no
padrão, você sofre com isso de alguma forma, o que é absurdo. Acontece que,
apesar disso ser tão rígido, poucas pessoas se encaixam naturalmente nesse
padrão e muitas pessoas estão fora dele e se identificam nessa luta. Creio que
o sucesso da página esteja diretamente ligado a isso. São muitas pessoas que
sofreram com o problema que apontamos e que têm vontade de lutar contra ele
conosco.
LdeL: Tipo, a mídia costuma impor estereótipos de beleza, determinar o que é feio e o que é bonito; o FANFC veio pra se contrapor a isso. Mas se, um dia, a mídia convencional dissesse que ter cabelo liso é feio e agora o que tá na alta é cabelo cacheado, crespo, vocês criariam o “Faça amor e faça chapinha”? (kkkkkk)
LC:
Com certeza não. A ideia da página
não é apenas ser “do contra”, existe todo um caráter político e social por trás
disso tudo. Ao contrário do que tentam fazer parecer, a afirmação do cabelo
cacheado e crespo (principalmente) não é por modismo. Lutamos pela afirmação
das pessoas na sociedade da forma que elas são. Lutamos principalmente pela autoestima
das pessoas, pelo amor próprio, para que elas se sintam bem sendo o que elas
realmente são, não pelo que esperam que elas sejam. É justamente de ser contra
a imposição de que se deve usar desse ou de outros métodos para "alcançar
a beleza" que se trata o FANFC. Somos contra a implantação da ideia
absurda de que, como já diz lindamente o texto de Emicida e Elisa Lucinda, “ter
que ser outro para ser alguém.”
LdeL: Muita gente envia depoimentos pra vocês, mas sempre tem um depoimento que realmente marca. Qual foi o exemplo que mais marcou vocês, quem foi ajudado pela página e entrou pra história do FANFC?
Foto: Fernanda Cavalcanti |
LC:
Acho que cada administradora
vivenciou uma situação diferente e marcante. Um dia desses estávamos na rua e
uma menina super emocionada veio dar um abraço em Katarina, pois disse que foi
graças a ela que decidiu abandonar a química e fazer a transição, o que nos faz
ver o quanto a visibilidade proporcionada pela página é importante. Porém, pra
mim, a história que marcou foi de uma criança do Sul, que estudava numa escola
onde todos tinham cabelo liso exceto ela, que sofria bullying com isso e, por
consequência, odiava seu cabelo, porém, achava as moças das fotos postadas na
página lindas. A irmã dessa criança curtia a página e nos enviou uma foto dela.
Um tempo depois ela estava com a irmã olhando a página e viu sua foto repleta
de elogios e disse “que menina linda!” e sua irmã respondeu “é você!”. No dia
seguinte a menina chegou na escola com seu cabelo solto, cheia de orgulho dele
e, como sempre, soltaram piadinhas de mal gosto, porém, dessa vez ela
respondeu, dizendo que era linda e que tinha orgulho de seu cabelo. Que era
linda por ser diferente, e as crianças pararam de fazer bullying com ela e ela
passou a se amar por ser quem é.
LdeL: Sempre tive uma dúvida, confesso, por que o “faça amor” e não qualquer outra coisa?
LC:
Como eu disse, o FANFC iniciou na
referencia da “Faça amor, não faça a barba”, que usou a frase “Faça amor, não
faça guerra”, de John Lennon pra falar de seu tema (barba). Bebendo dessas
fontes todas foi que surgiu o nosso nome, mas a interpretação que usamos do
trecho “faça amor”, no nosso caso, é pra falar de respeito, amor próprio e amor
ao próximo, mas, também, numa menção a um dos sentidos da frase original, a de
John Lennon, também usamos pra fazer de liberdade.
I Encontro Faça Amor, não faça chapinha |
LdeL: Normalmente, por cultura eu acho, as meninas se preocupam mais com o cabelo, mas quando visitei a página de vocês eu percebi que muitos meninos demonstram essa preocupação. Vocês acham isso legal ou veem algum problema nisso?
LC:
Isso é ótimo, pois não são só
mulheres que são afetadas quando se fala de padrão. Um exemplo é pensar que um
homem de cabelo liso e um pouco grande não enfrenta os problemas pra conseguir
um emprego, por exemplo, que um homem de cabelo crespo, um pouco grande,
receberia. O homem também tende a passar por preconceito quando tem um cabelo fora
do padrão. Portanto, também fazem parte desse tema.
LdeL: Agora um jogo rápido: defina o FANFC em uma só palavra.
LdeL: Obrigado por responder às perguntas. Muito sucesso pra todos vocês!!
LC:
Valeu, também!
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